Black music alagoana para todas as cores, credos e opções
Diogo Braz
Eles fizeram um ótimo show na estreia do projeto Outras Ondas e são legítimos representantes dos bairros mais distantes. Conhecida da noite maceioense por seu repertório de versões para sucessos de outros artistas, a banda Favela Soul agradou também com um repertório autoral. Para saber mais um pouco sobre o trabalho e as impressões que eles tiveram do show no Linda Mascarenhas, o Blog do Espaço Cultural Linda Mascarenhas conversou com os vocalistas Jhon Raifer e Nando Rozendo, o Tribo. Tudo e mais um pouco, você também pode saber logo abaixo. Boa leitura!
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Favela Soul no palco do Linda Mascarenhas - Foto de Everton Batista |
O show da Favela Soul na estreia do projeto Outras Ondas teve uma boa
repercussão: casa lotada, elogios do público, muitos aplausos. E para vocês,
como foi a experiência, o que acharam do show?
Tribo - Não temos palavras pra descrever o quanto estamos felizes
pelo convite do IZP para abrir o Projeto Outras Ondas. A nossa felicidade foi
dobrada com a presença de um público que lotou o Linda Mascarenhas. A galera
estava num super astral e respondeu com uma energia contagiante do início ao
fim. Pra nós, foi um desafio mostrar um repertório fundamentalmente autoral, já
que, até então, nosso set list era,
em sua maioria, feito de versões. Foi motivador ter essa resposta imediata da
plateia, e também ouvir o “burburinho” após a apresentação com as mensagens de
felicitações e incentivo que ainda estamos recebendo.
Jhon Raifer - Foi uma experiência extremamente linda e especial. Pra
mim, principalmente, porque foi o meu primeiro show com a Favela Soul. Estava
muito nervoso, mas depois que nós subimos no palco, a sintonia foi perfeita,
parecia que nós já estávamos há um bom tempo na estrada. O público ajudou
bastante! O teatro tava lotado! Eles cantaram, dançaram, sorriram e vieram
falar conosco depois do show, querendo saber de agenda, contatos, foi incrível!
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Jhon Raifer - Foto de Everton Batista |
Como vocês enxergam o cenário musical da cidade para o som que vocês fazem? Não existe muita gente fazendo Soul Music autoral aqui em Maceió.
Jhon Raifer - O nosso som é bem distinto do que as outras bandas
fazem. As pessoas se importam muito com o que vai vender e não com o que
realmente gostam de fazer. É difícil chegar a algum local com suas próprias
canções esperando que alguém queira escutá-las. As pessoas estão acostumadas e
querem ouvir o que toca nas rádios, mas nós não queremos fazer só isso.
Queremos mostrar o que pensamos, o que sentimos, nós temos voz.
Tribo - Temos uma nova geração de artistas com um trabalho muito
interessante em várias vertentes. Além disso, temos um ótimo público, jovem,
curioso, querendo ouvir coisa nova e de qualidade. Ainda esbarramos na falta de
incentivo para movimentar esse cenário, ver essa galera alternativa ganhar
espaço com um trabalho que realmente represente o que nossa cultura tem de
melhor, e não ver músicos e grupos tendo que se prostituir musicalmente para
poder ver seu trabalho com algum tipo de respaldo em termos financeiros ou de
reconhecimento.
Vocês acham que o trabalho que vocês vêm desenvolvendo com o cover atrapalha ou ajuda na formação de
público para a música autoral de vocês?
Tribo - Não atrapalha. A gente só toca o que gosta e acaba sendo
influência na nossa musicalidade e, consequentemente, tendo relação com nosso
trabalho autoral. E também temos o cuidado de dar outra roupagem para as
músicas, deixar elas com a nossa cara, e não simplesmente reproduzir. Além de
ser prazeroso pra nós tocar músicas que estão na nossa formação musical é
interessante a recepção do público para essas músicas conhecidas com uma pegada
diferente.
Jhon Raifer - Nós fazemos a MPB (Música Preta Brasileira) e, quando
fazemos os covers, estamos mostrando
quem são as nossas influências. E o público também gosta disso. Eles querem
ouvir algo que também se identificam de uma forma diferente. E essa é a nossa
proposta. Não queremos ficar na linha do "mais do mesmo", entende?
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Nando Rozendo a.k.a. Tribo - Foto de Everton Batista |
A música de vocês fala muito sobre bandeiras do movimento Black. Como
vocês avaliam a sociedade alagoana em relação a essas lutas?
Tribo - Pra nós, é fundamental expressar nosso ponto de vista sobre
o que envolve nossas vidas. Nossas músicas tratam de temas do nosso cotidiano e
é inevitável falar de temas como desigualdade social, violência, falta de
assistência do Estado, coisas que os moradores de bairros periféricos de
qualquer lugar estão vivendo no seu dia a dia. A Favela Soul é formada por
integrantes que moram em bairros marginalizados, como o Jacintinho, Bebedouro,
Feitosa, Colina e que, apesar de formações musicais diversas, temos um ponto em
comum, que é a música de origem negra, seja no reggae, hip hop, jazz, funk. Então, é natural que esses temas que
são bandeiras do movimento black
estejam presentes na nossa música. Mas não se trata apenas da questão do negro,
e sim de toda uma massa que está, de alguma forma, sendo privada de direitos
básicos e fundamentais para qualquer ser humano. Seja pela cor da pele, classe
social, origem étnica, orientação sexual ou opção religiosa. É preciso bem mais
que "pão e circo", é preciso ter acesso à educação de qualidade,
saúde, moradia digna, emprego, acesso à cultura. Estamos aí pra botar o dedo na
ferida.
O que vocês acharam do Projeto?
Jhon Raifer - O projeto é maravilhoso! Está abrindo portas para os
artistas da terra que querem mostrar seu talento. Precisamos desse apoio. As
pessoas precisam valorizar o que tem aqui. Ninguém imagina, mas temos artistas
incríveis que não recebem apoio e nem o valor que merecem. Isso começa pelos
próprios amigos que não valorizam, que não apoiam. Sabe, eu tenho, 11 anos de
carreira, já fiz vários trabalhos, muitos shows e pode parecer incrível, mas eu
conto em poucos dedos de uma mão quantos desses meus "amigos" foram a
um show meu. Então a valorização não é apenas da TV, da rádio, dos meios de
comunicação em geral, as pessoas tem que rever seus conceitos e aprender a
apreciar o quer as pessoas querem dizer.
E agora, qual será o foco da carreira de vocês, o cover ou o autoral?
Tribo - Nosso foco agora é trabalhar nosso repertório próprio e
correr na produção para lançar nosso primeiro álbum. Com esse apoio do IZP as
coisas vão se tornar mais fáceis, mas o caminho ainda é longo. Claro que nosso
repertório também vai incluir músicas de artistas que são referência pra nós,
mas nosso foco agora é o repertório autoral.
Jhon Raifer - Nós queremos continuar mostrando para as pessoas o
porquê da Favela estar aqui, queremos continuar mostrando nossas letras, nosso
som, a nossa alegria, a nossa raiva, tudo isso em forma de canção. E com certeza
continuaremos homenageando – essa é a expressão correta: homenageando – os
artistas que nos influenciaram, tocando as suas músicas e, a cada dia, amadurecendo
com cada experiência.
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