A arte de revolucionar: Temporadas teatrais de “Rock-me” e “Luar e
Serena: O Casamento”
Diogo Braz
A arte é
transformadora, revolucionária! Quando realmente tocadas pela arte, as pessoas
podem mudar totalmente a maneira de perceber o mundo ao redor. Assim é com o
Teatro, arte de encenar. Para “brincar” de ser outros personagens, o ator
necessita de sensibilidade para perceber, criar e passar uma mensagem ao
público. E assim o público deve entender o Teatro, como veículo de mensagens,
igualmente revolucionário e transformador.
O Espaço
Cultural Linda Mascarenhas, aparelho cultural do Instituto Zumbi dos Palmares
(IZP), vem buscando trabalhar o Teatro dessa forma, encarando-o não somente
como opção de entretenimento, mas como uma ferramenta de transformações
sociais. Abrindo suas portas para que companhias e grupos ensaiem e montem suas
peças em pequenas ou médias temporadas, o Espaço Linda tem como filosofia
apoiar espetáculos, peças ou qualquer outro tipo de manifestação que trabalhem
com os aspectos menos comerciais da arte, e que possam deixar para o público um
resultado eventualmente transformador na vida das pessoas que pelo teatro possam
ser tocadas.
 |
Logomarca do Espaço Linda já mostra sua afinidade com o Teatro |
Os exemplos
mais recentes desse modus operandi são
as montagens “Luar e Serena: O Casamento”, da Companhia Teatral Simsenhô, e “Rock-me”,
do grupo Infinito Enquanto Truque (IET).
Luar e Serena: O Casamento
Ambientada
no Sertão, a peça conta, por meio de uma linguagem leve e descontraída, a história
de Luar, um rapaz namorador que deixa todas as mulheres de
lado para dedicar sua paixão a Serena, moça cuja beleza também é objeto de
desejo do valente Tempestade, fora da lei que inspira medo por onde passa. O
texto também traz outros personagens como a primeira-dama perua e volúvel da
cidade, o prefeito enganado, a filha espevitada dos dois, o amigo malandro do
herói, o fantasma do avô da mocinha e um padre mulherengo. Figuras caricatas
que passeiam numa trama cheia de confusões e frases espirituosas. “Esse foi o
primeiro texto que eu escrevi e ele foi totalmente baseado numa história
romântica do Nordeste, algo que pudesse transmitir muita alegria, muitos risos,
escrito com o pensamento de fazer as pessoas sorrirem”, revelou o diretor e
autor do espetáculo, Adaílton Moreira. A peça ficou em cartaz em uma curta
temporada, nos dias 20 e 27 de maio, com quatro espetáculos, sendo dois por dia.
 |
Cia Teatral Simsenhô em foto de divulgação do espetáculo |
Luar e Serena é
o resultado do trabalho desenvolvido pelo professor Adaílton Moreira junto com
alunos do Colégio Gilvana Ataide Cavalcante Cabral no projeto Tempo Integral,
que oferece ao alunado uma série de atividades extracurriculares, como esportes
e atividades artísticas. A própria Companhia Simsinhô nasceu do projeto, há
dois anos, e reúne hoje vinte e dois integrantes. Só na peça Luar e Serena, participam
14 atores, que se dividem em dois grupos, um para cada sessão do dia. “Nós
temos vários membros que fazem regra três. Então, a gente pegou esse pessoal e
colocou na primeira sessão do dia e os titulares na segunda apresentação, pra
não deixar ninguém de fora”, explicou o diretor. “O pessoal da primeira
apresentação, na estreia, teve de mostrar trabalho, um belo espetáculo, para
garantir que eles se apresentassem novamente no segundo dia. Foi um teste e
eles foram aprovados, com certeza”, elogiou o professor.
 |
Bom humor com sotaque nordestino - Foto de Diogo Braz |
O público
compareceu e prestigiou o trabalho dos atores iniciantes, que se saíram bem,
com desenvoltura merecedora de aplausos nas quatro sessões. “Eu gostei, os meninos
se saíram muito bem. Essa é uma iniciativa muito boa, porque proporciona espaço
para novos atores. E a gente precisa apoiar os atores da terra para que nosso
Teatro tenha mais força”, elogiou o repórter cinematográfico Jacinto Branco.
Para os
atores, o resultado de um ano de ensaios foi bem satisfatório. Ao som dos aplausos,
eles parecem ter a certeza de que o Teatro tocou as suas vidas, revolucionando
sua maneira de lidar com o mundo. “O Teatro mudou muita coisa na minha vida. É
interessante porque hoje eu me conheço mais profundamente e tenho contato com
outras pessoas através da arte, e a arte em si vem tomando conta das nossas
vidas”, explica Caroline Mendonça, que interpreta Serena.
 |
Casal apaixonado de protagonistas - Foto de Diogo Braz |
Para Adaílson
Santos, que interpreta Luar, o Teatro trouxe mais alegria para sua vida. “Mudou
o modo da minha alegria, ele me deu mais liberdade. Antigamente eu era bem
tímido, mas hoje em dia, através do Teatro, eu sou bem extrovertido. Não tenho
mais vergonha de ninguém”, revela o jovem ator. Para Liza Lobato, que
interpreta a mulher do prefeito, a arte de interpretar lhe deu mais confiança. “O
Teatro mudou muita coisa. Eu me tornei mais confiante, perdi a vergonha e o
medo de me expressar em público. Hoje eu tenho mais certeza do que eu quero”,
afirma a jovem.
 |
Aventuras descontraídas do Sertão brasileiro- Foto de Diogo Braz |
No final da
noite, o trabalho exibido no palco foi coroado com a aprovação do público e do
professor, que elogiou os alunos por todo o processo de montagem da peça. “Montar
este espetáculo com os alunos está sendo uma experiência maravilhosa, porque eu
gosto muito de trabalhar com jovem, com a comunidade, com a periferia e gosto
também de trabalhar com estudantes. Esta é a minha primeira experiência do
tipo, mas eu garanto que é a melhor experiência da minha vida; tirando jovens
da marginalidade, de pensamentos promíscuos, resgatando vidas das drogas: hoje
eu estou particularmente realizado neste trabalho”, revela Adaílton Moreira.
 |
O Casamento - Foto de Diogo Braz |
Os interessados em conhecer mais
sobre o trabalho da Cia Simsenhô, pode acessar a página do grupo no Facebook:
Rock-me
Recém-estreado,
no sábado passado, o espetáculo do Grupo Infinito Enquanto Truque é mais um
belo exemplar da dramaturgia de Lael Correa. Com texto livremente adaptado da
peça “Hoje é dia de Rock”, do mineiro José Vicente, Rock-me é um exercício de
Teatro para pessoas que buscam a reflexão acima do entretenimento.
 |
Rock n' Roll em cena - Foto de Diogo Braz |
Mesmo com os
problemas técnicos de sonoplastia acontecidos na estreia – e mesmo sendo uma
peça que tem a música, a trilha e os efeitos sonoros como fio condutor de sua
narrativa – o IET conseguiu mostrar um texto inteligente sobre o impacto das
revoluções culturais trazidas pelas ondas do rádio em uma família sertaneja
desde a década de 1950 até o início de 1970.
Os atores Bruno Alves, Cid Brasil, Dinah Ferreira, Monica Dogati, Paula Gomes,
Ticiane Simões, Wagner Santos e Walfredo Luz estão muito bem em cena; há
um entrosamento que é fruto de longos ensaios e de sensível direção de atores, o
que faz com que o público não sinta, por exemplo, estranheza ao ver a jovem
Ticiane Simões interpretar a mãe de cinco atores em sua mesma faixa etária fora
dos palcos. Sobre o tablado não, cada um tem a idade de seus personagens. Os
atores também encarnam pessoas em diferentes épocas de suas vidas e é possível
notar isso na mudança dos gestos, que vão amadurecendo no decorrer do espetáculo.
 |
IET e seus atores iluminados - Foto de Diogo Braz |
O fervilhar dos
personagens, representado ao mesmo tempo em que interage com o Rock – estilo
musical que é essencialmente rebeldia – está bem caracterizado nos dilemas da
família: as questões existenciais; a dúvida entre o sagrado ou o profano; os
impulsos sexuais; a falta de identificação com o mundo ao redor, seja entre os
próprios membros da família ou em relação à sociedade e sua época; um turbilhão
de questões que são mais sugestões que a própria solução de problemas, isso é
tarefa reservada para o público, que é quem busca encontrar os seus próprios sentidos
e identificações com o que foi encenado na peça. Longe de ser um drama
existencial, a Rock-me propõe essa reflexão de forma até mesmo descontraída,
num texto repleto de momentos alegres, juvenis.
 |
Atores em meio ao público - Foto de Diogo Braz |
Ao final do
espetáculo, aplaudido de pé, o grupo se desculpou pelos problemas técnicos e
agradeceu ao parceiro de realização, o Instituto Zumbi dos Palmares, e ao público,
que não pareceu ter se influenciado pela falha técnica. “A peça foi
maravilhosa, mesmo sabendo que os integrantes do grupo estão meio tristes pelo
problema da sonoplastia. Mas, para mim, isso não tirou o brilho não, foi
maravilhoso”, elogiou o ator Andrey Stefani. Para a estudante de Jornalismo
Bruna Cabral, os problemas atrapalharam, mas não comprometeram a apresentação. “Eu
achei que os defeitos técnicos tiraram um pouco do feeling da peça, mas mesmo assim foi incrível. A trilha sonora é
muito boa, pra quem quer curtir um pouquinho de Rock n’ Roll e ver uma história de décadas tão importante para a
história do Rock, é muito bom”, avalia Bruna.
 |
Dilemas universais de uma família sertaneja - Foto de Diogo Braz |
Nivaldo Vasconcelos,
membro do Cineclube Ideário, também elogiou a montagem. “A peça é muito legal,
tem uns jogos de cena muito interessantes, a iluminação tem efeitos bem legais,
os atores estão ótimos. A direção é massa, tem uns truques, umas brincadeiras.
E a música vale a pena. Venham assistir!”, convida o cineclubista.
Membros da Companhia
Teatral Simsenhô – que estava em cartaz no Espaço Linda Mascarenhas com a peça “Luar
e Serena: O Casamento” – não perderam a oportunidade de prestigiar a estreia de
“Rock-me” e trocaram figurinhas com os atores do IET. Para a atriz Rafaela
Maria, todos em cena desempenharam bem os seus papéis. “Eu gostei muito da peça,
os atores estão de parabéns. O elenco é ótimo, nem estavam nervosos. Foram
atuações lindas, eu achei perfeito”, elogiou a atriz.
 |
Aplausos recíprocos entre atores e público - Foto de Diogo Braz |
A peça Rock-me
ficará em cartaz até o final de julho, sempre aos sábados, no Espaço Cultural
Linda Mascarenhas. As sessões serão às 20 horas e, ao contrário da estreia, as
próximas sessões não serão gratuitas. Os ingressos serão vendidos no próprio
Espaço Linda Mascarenhas. Mais informações: 8887-8795; 8800-1087 ou 8826-6626.